11 de setembro de 2015

Filmenista: Vênus Noire (2010)

Vênus Noire é um filme que dói.   Baseado na biografia de Saartjie Baartman: nascida no final dos anos de 1780, na comunidade  Khoisian na África do Sul. Perdeu a mãe ainda criança e na adolescência perdeu o pai e o irmão. A comunidade onde Saartjie vivia foi atacada pelos colonizadores holandeses, ela foi feita de escrava. Em 1810, o médico inglês William Dunlop conheceu Saartjie, interessou-se pelas suas formas corporais: nádegas e seios grandes e genitália externa (tipo físico conhecido como Vênus Hotentote). Dunlop  convenceu o proprietário de Saartjie a permitir que ele a levasse para Europa, onde ela seria objeto de estudos científicos em função de seu corpo incomum. Porém, Saartjie foi levada a Londres, onde  foi colocada em exposição como objeto exótico.  Ela permanecia  semi-nua, realizava algumas danças em seguida o público era convidado  por Dunlop a tocá-la nas nádegas e os seios. Alguns espectadores a cutucavam com uma vara. O show de horrores de Dunlop revoltou um um grupo de abolicionistas, que  levou Dunlop ao tribunal, alegando que ele mantinha Saartjie em cativeiro contra a vontade dela. Saartjie testemunhou a favor de Dunlop no tribunal, alegou que ela era apenas uma mulher tentando ganhar um salário honesto, o caso foi arquivado. A polêmica popularizou a exposição e a Vênus Hotentote foi levada a Paris, onde foi vendida  para um domador de animais. Além de ser exposta como "animal exótico" seu corpo foi usada em "pesquisas científicas". 



Quando o público e os cientistas perderam o interesse por ela, seu dono a obrigou a se prostituir. Saartjie morreu em 1815, aos 25 anos, vítima da sífilis. Seu corpo foi vendido para o Museu Natural de Paris, onde foi dissecado e empalhado, permanecendo em exposição por muitos anos. Posteriormente, o corpo foi substituído por um molde de gesso. Com o fim do regime de Apartheid, o governo de Nelson Mandela iniciou uma campanha para que os restos mortais de Saartjie fosse devolvido para África do Sul e recebesse um sepultamento digno. Finalmente, em 2002, depois de uma campanha de quase uma década, o governo francês devolveu  o corpo  de Saartjiede para África. 
Em um tempo que os corpos das mulheres brancas eram escondidos por camadas e camadas de roupas, os corpos das não-brancas e das classes subalternas estavam sujeitos a "apreciação" pública, bem como à exploração sexual.  O caso de Saartjie é paradigmático da objetificação a que eram submetidos os corpos das mulheres de grupos humanos escravizados e colonizados. Retratadas pelos evolucionistas como figuras zoomórficas, "aberrações" que confirmavam o progresso do "tipo europeu" em relação aos demais tipos humanos. Um corpo apto a demarcar as diferenças raciais  e evolucionárias. Há quem pense essa sociedade que tratava as mulheres negras como "bichos exóticos" foi totalmente superada, que vivemos outros tempos, mas inúmeros exemplos contemporâneos demonstram o contrário. Ainda hoje, as mulheres negras colhem os frutos desse pensamento, sendo constrangidas ou a se enquadrar nos esteriótipos de "corpo exótico" ou a lutar arduamente para superar a desumanização produzida por esses esteriótipos e a exploração de seus corpos. 
A história de Saartjie foi retratada no filme Vênus Noire: 

Filme completo (legendado)